quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

UM NOME QUE MERECE RESPEITO

5/12/2010 -

Oscar Niemeyer: o eterno arquiteto completa 103 anos

Helena Mader e Juliana Boechat
Correio Braziliense
Fábio Costa/JCom/D.A Press 

Na última segunda-feira (13/12), Niemeyer se encontrou com o governador eleito do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), para tratar da construção do Museu de Ciência e Tecnologia, em Brasília

O mestre comemora mais um aniversário em meio ao sucesso, ao reconhecimento internacional e a algumas frustrações profissionais. Apesar da idade avançada, o carioca nascido no bairro de Laranjeiras se mantém criativo e em busca de novos projetos arquitetô

O maior nome da arquitetura brasileira, reconhecido pela genialidade também no exterior, deixará a fama e o renome de lado nesta quarta-feira (15/12) para comemorar o 103º aniversário ao lado da família e dos colaboradores mais próximos. Provavelmente, sequer lerá as dezenas de artigos, reportagens e análises que serão escritas sobre a vida e a obra. Oscar Niemeyer não gosta de textos sobre a própria arquitetura. Segundo ele, trata-se de um segredo para preservar a intuição. Três anos depois de completar um século de existência, o arquiteto que traçou as curvas “livres e sensuais” dos monumentos de Brasília ainda dedica parte dos seus dias ao trabalho. A mente inventiva trava uma batalha constante com o corpo frágil e centenário para criar projetos novos e cada vez mais revolucionários.

Apesar do amor e da dedicação à arquitetura, Oscar Niemeyer gosta mesmo da presença da família. Os 103 anos do modernista serão celebrados com a presença da mulher, Vera Lúcia, da única filha, Anna Maria, dos netos, bisnetos e trinetos. A esta altura da vida, o homem de respostas diretas ainda levanta a bandeira política. E assim pede para ser lembrado: “Um arquiteto que sempre se manteve fiel às suas ideias, à busca da beleza, à procura da surpresa arquitetural, ao interesse em explorar todo o potencial do concreto armado. Além de ver transformado este mundo injusto que nos cabe viver”, afirmou (leia entrevista ao lado). Ainda hoje, Niemeyer desenvolve novos projetos, como o aquário de Búzios (RJ) e uma biblioteca monumental desenhada para a capital de um país árabe. Em 75 anos de carreira, o arquiteto se ressente de não ter visto sair do papel a polêmica Praça Monumental e o Sambódromo, ambos planejados para Brasília.

O amigo e companheiro de trabalho Carlos Magalhães, responsável pelo escritório de Niemeyer em Brasília, diz que Oscar não liga para aniversários. “Para ele, é só mais um dia que vai vencer”, revela. Magalhães conta que o parceiro de projetos ainda gosta de se debruçar sobre pranchetas e que sonha em executar novas obras arquitetônicas em Brasília. “Antigamente, ele era mais agressivo na procura por trabalho. Mas a idade vai amaciando as pessoas, a gente vai perdendo o ferrão”, brinca. Segundo Magalhães, o prédio do Congresso Nacional é um dos maiores orgulhos de Oscar Niemeyer. “Ele dizia que a gente podia rodar o mundo inteiro que jamais veria uma coisa semelhante. O prédio alto, com suas cúpulas, a plataforma ligando os eixos, tudo isso faz ele se orgulhar”, afirma o arquiteto.

O professor da Universidade de Brasília (UnB), aluno durante 17 anos e grande admirador de Oscar Niemeyer, Claudio Queiroz, acredita que o modernista traduz nas obras a cultura brasileira. “Ele criou uma noção de brasilidade na arquitetura. Quem cai de paraquedas e vê as colunas romanas, sabe que está na Itália. Quem vê as colunas feitas por Niemeyer sabe que é o Brasil, a mistura de etnias e das nossas mulheres”, defendeu. Para ele, a arquitetura do carioca transforma a capital do país em uma cidade “simples e elegante”. “Niemeyer soube dizer na arquitetura aquilo que temos vontade de dizer. É o jeito que nós somos. Assim como a ginga do Garrincha, o oportunismo do Pelé e a capoeira, existem as obras de Niemeyer. Ele está para o mundo como Aleijadinho está para Minas Gerais”, comparou.

Brilho
Claudio Queiroz ressalta o trabalho inovador de Niemeyer com o concreto. “Ele soube, como ninguém, usar a condição do concreto armado para criar os espaços vazios e acabar com as paredes que erguem o segundo andar”, disse. Responsável pelos traços e curvas de cartões postais de várias cidades do Brasil e do mundo, Niemeyer está sujeito a críticas e elogios a todo instante. Mas até mesmo quem não concorda com as obras assinadas por ele reconhece a importância do trabalho. A professora da Faculdade de Arquitetura da UnB Sylvia Ficher considera o modernista “único” pelo volume de construções idealizadas por ele, além do longo período de trabalho, da juventude até hoje. “Ele tem um percurso arquitetônico que mudou ao longo do tempo. Tem o Oscar Niemeyer do início da década de 40, o das décadas de 50 e 60, o dos anos 70 e o dos últimos 30 anos, com uma arquitetura colossal e com ênfase na forma”, explicou a historiadora da arquitetura.

Segundo Sylvia, São Paulo é privilegiada com a qualidade das obras de Niemeyer, enquanto Brasília sofre com a quantidade de edifícios com a assinatura dele. “Na década de 50, ele passou por um momento de brilho, de grande criatividade em relação aos valores que ele atribui à arquitetura”, explicou. Nesse período, foi construído o Ibirapuera, o Edifício Copan, o Edifício Montreal e a Galeria Califórnia, que quebraram o concreto quadrado da capital paulista.

Na capital do país, por outro lado, a historiadora critica o domínio do mercado da arquitetura cívica. “No meu entender, obra pública tem tudo a ver com concurso público”, rebateu. Apesar das críticas, ela acredita que Niemeyer é “injustiçado”. Segundo Sylvia, ao mesmo tempo que Oscar incentiva e encoraja artistas de todo o mundo, aqueles que bebem da fonte de criatividade do carioca não lhe dão os devidos créditos. “Ele é muito elogiado e inspirador, mas, em contrapartida, a influência dele ainda é pouco estudada”, defendeu.

INAUGURAÇÃO
» No dia em que completa 103 anos, o arquiteto Oscar Niemeyer participará da inauguração do sexto prédio do complexo Caminho de Niemeyer, em Niterói. (RJ) A fundação que leva o nome do arquiteto tem aproximadamente 4 mil metros quadrados e abrigará um espaço cultural, Centro de Pesquisa e Documentação e a Escola Niemeyer de Arquitetura e Humanidades. Esta é a sexta obra do Caminho. Ainda falta a construção da Torre Panorâmica, do Centro de Convenções e do Centro Petrobras de Cinema. Durante o evento, será distribuída a nova edição da Revista Nosso Caminho, de publicação trimestral.

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