IPÊS
Amo os ipês. Plantei um ipê na rua, em frente ao meu escritório. Já está com quase 2 metros de altura e já mostrou umas poucas flores amarelas. Mas, como toda árvore, como todo ser vivo, ele quer espaço. Os seus galhos crescem para os lados, para a rua , para a calçada. Mas a calçada é larga. É só desviar deles e desejar – lhes um bom dia. Pois, dias atrás, quatro de seus galhos que se estendiam pela calçada amanheceram quebrados. Fiquei pensando na alma da pessoa que fez aquilo. Que estranho prazer esse de quebrar os galhos de uma árvore mansa! São sentimentos de um torturador. Alguém que tem prazer em quebrar galhos de uma árvore, sem necessidade, terá prazer também de fazer sofrer um animal ou uma pessoa.
Ao sentimento inicial de raiva seguiu – se um outros de profunda piedade: que deserto horrível e seco deve ser sua alma. Sua alma tem medo dos ipês porque nela há desertos. Horrorizamo - nos com os criminosos. Milhares há que gostariam de juntar – se a eles. Se não o fazem é por falta de coragem. Contentam – se em quebrar os galhos de Ipês...
(RUBEM ALVES, QUARTO DE BADULAQUES, Parábola Editorial, 2003)
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